PMSP/SMC/DPH
São Paulo, janeiro/março de 2011
Ano 5 N.28 

Abertura | Biblioteca | CCAD | Estudos e Pesquisas | Manuscritos | Ns.anteriores

  • ESTUDOS & PESQUISAS
  • A TV Tupi no acervo do Arquivo Histórico de São Paulo:
    novas fontes



    José Inácio de Melo Sousa
    Pesquisador convidado



    | O bairro do Sumaré | A ocupação do bairro | A chegada da televisão | Notas | Fontes |


    O bairro do Sumaré

    A formação do bairro do Sumaré deveu-se ao legado do padre pernambucano Joaquim Floriano Wanderley. Ele possuía uma fazenda na antiga sesmaria do Pacaembu, doada por Martim Afonso de Souza aos jesuítas, ocupando as áreas correspondentes aos atuais bairros do Pacaembu, Sumaré e parte de Higienópolis. A propriedade do padre Wanderley era chamada de “sítio Wanderley”, ou “chácara Wanderley” 1. A antiga sesmaria tinha os seus limites no caminho dos Pinheiros (atual Rua da Consolação), Emboaçaba (estrada do Araçá, depois Avenida Municipal, atual Avenida Dr. Arnaldo) e córrego Água Branca (Perdizes). Conforme testamento registrado no 3º. Cartório da Família e Sucessões (talvez o mais correto fosse a menção à atual 3ª. Vara de Família e Sucessões), em 10 de novembro de 1891, a gleba foi dividida na sua maior parte em duas, restando ainda parcelas de terrenos em nome dos herdeiros. Uma delas, a que se chamava “Pacaembu de cima”, foi deixada ao Asilo das Meninas Órfãs Desamparadas Nossa Senhora Auxiliadora, localizada no Ipiranga, dirigida pelo conde papal José Vicente de Azevedo; a segunda, denominada “Pacaembu de baixo”, foi destinada ao Colégio São Miguel de Jacareí, dirigido pelo cônego José Bento de Andrade. Com a morte por febre tifóide do Padre Wanderley, em março de 1892, procedeu-se à abertura do inventário. Os herdeiros contestaram o testamento, embargando-o na Justiça2.

    O Colégio São Miguel tinha sido fundado em 29 de setembro de 1885 como instituição escolar, educativa e profissionalizante de meninos pobres e desvalidos da Paróquia de Jacareí. O Cônego José Bento morreu em 1897 sem ver resolvida a pendência judicial. O sucessor na paróquia foi o Cônego Amador Bueno de Barros que não conseguiu manter aberta a casa de recolhimento e educação, fechando-a em 1905. Com o deslocamento do cônego para o Rio de Janeiro, onde foi dirigir o Asilo Isabel, o encargo de acompanhamento da ação judicial foi passado para o bispo de São Paulo, D. José de Camargo Barros, que morreu logo depois, em 1906, sem ver também a solução legal do inventário. D. Duarte Leopoldo e Silva, novo bispo da diocese, assumiu a questão. Com a criação da diocese de Taubaté novo campo de luta se abriu porque a diocese de São Paulo se achava no direito de receber o “legado Wanderley”. Os herdeiros do padre perderam a ação no Supremo Tribunal Federal em 1911. Por decisão arbitral dos bispos de Botucatu e Campinas, o legado passou para diocese de Taubaté, desde que fosse reaberto o Colégio São Miguel. A Companhia City comprou a gleba do Colégio São Miguel em 1914, abrindo o bairro do Pacaembu. Os herdeiros venderam para Victor Nothmann e Martin Burchard os terrenos que lhes cabiam no testamento, incorporados ao loteamento de Higienópolis, que na urbanização da área deram origem às praças Vilaboim e Buenos Aires.

    A herança a que teria direito o Asilo das Meninas Órfãs é menos evidente. José Vicente de Azevedo (Lorena, 7/7/1859; São Paulo, 1944) vinha de uma família que tinha enriquecido com o comércio no Vale do Paraíba, tendo uma trajetória de ativismo católico desde a Faculdade de Direito (1878-1882), quando presidiu o Círculo dos Estudantes Católicos3. Com a proclamação da República, rendeu-se parcialmente à nova ordem: se de um lado participou da política paulista (foi deputado em várias legislaturas desde 1899 a 1918, sendo senador estadual entre 1925 e 1930), de outro procurou fazer a defesa da fusão do Estado e a Igreja, assinando manifesto por um partido católico em 1890.

    Os ângulos mais conhecidos de sua vida são o da filantropia e o da benemerência, participando da organização de várias instituições religiosas masculinas e femininas destinadas à assistência e à educação (Irmãs de Sion, Irmãs de São José, Irmãos Maristas, Padres Salesianos, Terciários de São Francisco, etc.), fundando e dirigindo algumas delas como os Círculos de São José, entre 1889 e 1906, para a manutenção de escolas gratuitas para crianças e ensino noturno para operários, o Instituto Padre Chico para crianças cegas, e o Asilo das Meninas Órfãs. O depoimento da neta de Vicente de Azevedo, Maria Gabriela de Azevedo Franceschini, refere-se à inauguração do asilo, em 1896, para meninas brancas órfãs e desamparadas. Além do depoimento, não há outro estudo que aprofunde a história do asilo, já que as atenções se voltam para o Asilo Sagrada Família, ou Educandário Sagrada Família (de acordo com Souza e Hisldorf), pensado como um projeto para “[...] casas-asilo para ex-escravos e uma escola agrícola para seus descendentes, que não se concretizou na época, foi retomado em 1903, como resultado de entendimentos entre o bispo d. Antonio C. Alvarenga, as Irmãzinhas da Imaculada Conceição e o criador da congregação, o jesuíta padre L. Rossi, estabelecimento que a partir de 1918 funcionaria desdobrado no ‘Orfanato Santa Rita’, para pensionistas internas’ [...]”. A instituição foi datada para 1890, mas somente inaugurada em 1903. Maria Aparecida Correa Custódio não diverge muito da data de surgimento, 1890, matizando os objetivos: uma instituição para ex-escravos e seus descendentes, como o fornecimento de alimento, vestuário, abrigo e assistência4. O estatuto da Instituição Casas da Providência foi organizado somente em 3 de julho de 1902, sendo do ano anterior o entendimento com as Irmãs da Divina Providência para o trabalho na “futura obra”. O nome Instituição Sagrada Família apareceu mais tarde, assim como o Padre Luís Maria Rossi, que trouxe de Nova Trento, Santa Catarina, as religiosas da ordem Irmãzinhas da Imaculada Conceição, dirigida por Madre Paulina, objeto de culto e devoção na cidade catarinense, já que o acerto com as Irmãs da Divina Providência não vingou. Dessa forma, José Vicente de Azevedo se habilitou ao testamento de 1891 de uma forma pessoal quanto ao asilo que viria a dirigir. Talvez fosse pensamento do Padre Wanderley, conhecedor das obras pias do futuro herdeiro, que o legado se concretizasse mais tarde, destinando-se ao sustento e educação das meninas brancas desvalidas ou negras descendentes de escravos, mas essa é apenas uma especulação, que só será resolvida com o exato conhecimento do testamento.

    Ao contrário da diocese de Taubaté, José Vicente de Azevedo esperou mais dez anos para vender a área de 700 mil m2 correspondente ao Sumaré. A venda foi feita para a Sociedade Paulista de Terrenos e Construções Sumaré Ltda. O nome do bairro, Sumaré, foi escolhido por um dos sócios, José Rebelo da Cunha, que tinha como associados no empreendimento Paulo Rodrigues Alves, Joaquim Macedo Galvão e Zenóbia Alvarenga Monteiro Soares (outras fontes, como uma matéria do Diário Popular de de 3 de junho de 1968, citam ainda Canuto Waldemar Nogueira Ortiz e Cláudio Monteiro Soares, possivelmente com parentesco com Zenóbia). Desconhecemos os acertos estatutários da empresa. Sabemos, apenas, que todos tinham o pé fincado na exploração imobiliária urbana, alguns com negócios entrelaçados nos anos 1940-50, sendo Zenóbia investidora em dois prédios para cinemas. O arruamento foi planificado por Álvaro Neves da Rocha em 1925, replicando o empreendimento da City. O alvará de nº. 394 foi concedido em 20 de janeiro de 1926 e, entre os serviços que seriam realizados, especificava-se o alargamento da Rua Cardoso de Almeida entre a Avenida Municipal e a antiga Rua Dona Ismênia de 6 para 18 metros5.

    Arruamento proposto por Álvaro Neves da Rocha, 1925
    Arruamento proposto por Álvaro Neves da Rocha, 1925.
    Fonte: AHSP

    Os lotes regulares tinham 12 m de frente por 50 de fundo, situando-se em ruas arborizadas. No total eram 44 quadras com 858 lotes. José Vicente de Azevedo, membro da Irmandade do Rosário, reservou uma área triangular no limite da Avenida Municipal com a estrada para o alto da Lapa (atual Avenida Heitor Penteado), para a construção de uma igreja dedicada a Nossa Senhora do Rosário, que tinha sido demolida na Praça Antonio Prado, quando da retificação das ruas do centro da cidade. O conde, no entanto, conheceu o franciscano João Luís Bordeaux, superior geral da Ordem no Brasil, nas comemorações dos 25 anos da Missão Franciscana. A partir desse encontro, o destino da igreja foi outro, lançando-se em 1935 a pedra fundamental do Santuário de Nossa Senhora de Fátima, que foi entregue oficialmente em 29 de junho de 1950, dando-se a consagração da igreja em 21 de abril de 1953. O santuário de Fátima transformou-se, com o tempo, em um dos polos de atração de bairro. Os lotes começaram a ser vendidos em 1928 ao custo de Rs 4:000$000 (quatro contos de réis). Previa-se, dessa forma, que o loteamento totalmente vendido renderia aos incorporadores a soma de mais de Rs 3.000:000$000 (três mil contos de réis). Porém, a crise de 1929 teve um efeito nefasto sobre o empreendimento. Nos anos seguintes as vendas se estagnaram. Em 1936, Maurício e Jarbas Karman, da Sociedade Urbanizadora Brasileira, assumiram o negócio. Para incentivar novas vendas, eles cederam uma área para uma empresa de ônibus, já que o acesso ao Sumaré parava no cemitério da Irmandade do Santíssimo Sacramento com o bonde que saía do Parque do Anhangabaú. A garagem teria funcionado primeiro na Avenida Dr. Arnaldo, em 1938, mudando-se depois para a Avenida Prof. Afonso Bovero6.






    | O bairro do Sumaré | A ocupação do bairro | A chegada da televisão | Notas | Fontes |




    Para citação adote:

    SOUZA, José Inácio de Melo. A TV Tupi no acervo do Arquivo Histórico de São Paulo: novas fontes. INFORMATIVO ARQUIVO HISTÓRICO DE SÃO PAULO, 5 (28): jan/mar.2011. <http://www.arquivohistorico.sp.gov.br>

     
    EXPEDIENTE

    coordenação
    Liliane Schrank Lehmann

    edição de texto
    Eudes Campos

    webdesigner
    Ricardo Mendes

    distribuição
    Maria Sampaio Bonafé (coordenação)
    Elisabete De Lucca


    Normas Editoriais
    (2007) (formato PDF)

     
    Para receber o Informativo Arquivo Histórico de São Paulo
    - ou suspender a remessa -,
    envie um e-mail para:
    informativoarquivohistorico@prefeitura.sp.gov.br
     




    Prefeitura da Cidade de São Paulo - 2005-2010 (c)



    DPH


    SECRETARIA DE CULTURA


    Cidade de São Paulo


    Gilberto Kassab
    Prefeito da Cidade de São Paulo

    Carlos Augusto Calil
    Secretário de Cultura

    José Roberto Neffa Sadek
    Secretário Adjunto

    Paulo Rodrigues
    Chefe de Gabinete

    Walter Pires
    Departamento do Patrimônio Histórico

    Liliane Schrank Lehmann
    Divisão do Arquivo Histórico de São Paulo
    Informativo AHSP