PMSP/SMC
São Paulo, dezembro de 2012
Ano 8 N.31 

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  • ENSAIO TEMÁTICO
  • As ruas de São Paulo:
    Memória do cinema nos logradouros da cidade




    | Boca do Lixo e outras geografias | Cinema internacional | O cinema brasileiro... | Fontes |



    Boca do lixo e outras geografias

    Antes de identificarmos as referências ao cinema nas denominações de logradouros é oportuno comentar sua presença física - as salas, as empresas etc - na geografia urbana. Talvez a mais relevante, embora em sua forma atual constitua um aspecto em transformação radical no século XXI, seja a localização das salas de exibição na cidade.

    Para o espectador assíduo entre as décadas de 1940 e 1970, os “cinemas de rua” e sua localização são referências cruciais. A “cinelândia paulistana” é uma das expressões desse aspecto, localizada na região ao longo da Avenida São João, entre o Largo do Paiçandu e o Largo do Arouche, e junto ao cruzamento da São João com a Avenida Ipiranga. Nesse território estabelecem-se salas de grande porte com milhares de assentos, salas lançadoras de filmes etc.

    A partir da década de 1970 com a decadência da área central de São Paulo e o fortalecimento de centros regionais a rede exibidora fortalece outras áreas como a região da Avenida Paulista. Algumas salas do Centro Novo, situado a oeste do Vale do Anhangabaú, entram em decadência, sendo ocupadas por programações voltadas para a cinematografia de cunho erótico (primeiro, as pornochanchadas, depois as produções mais explícitas). Empresários da exibição procuram no entanto recuperar o público perdido investindo em remodelações com a divisão de grandes salas como os cinemas Olido, Ipiranga e Paissandu, entre tantos. Balcões se transformam em novas salas e, mais adiante, as intervenções ganham escalas mais extremas.

    Os cinemas em shoppings centers, em princípio um modelo antevisto muito antes nas salas que ocupavam galerias como o Cine Olido, imporão uma transformação radical na relação cinema, espectador e espaço urbano. As cinelândias como conceito se tornam uma forma do passado; agora a geografia das salas está subordinada de modo radical à geografia da nova forma de consumo, sem território preciso, sem identidade visual de uma arquitetura aberta para o espaço urbano. Anódino como os shoppings, os cinemas se tornam um só: um território do consumo unindo São Paulo a Bombaim, Rio de Janeiro a Nova York.

    Para o leitor interessado no tema recomenda-se pesquisas reconhecidas pela documentação e análise. A primeira, realizada por Inimá Ferreira Simões em 1990 para o Centro Cultural São Paulo, resultou na exposição e livro homônimos: Salas de cinema em São Paulo. Disponível para download, a publicação reúne documentação rara sobre os cinemas paulistanos desde o final da década de 1930 até 1990. Mais recente, mas focada nos momentos iniciais do desenvolvimento da rede exibidora em São Paulo durante o período do filme silencioso é a pesquisa realizada por José Inácio de Melo Souza com a documentação custodiada pelo Arquivo Histórico de São Paulo: Inventário dos espaços de sociabilidade cinematográfica da Cidade de São Paulo (1895-1929). A proposta, desenvolvida 2008 e 2009 com apoio de bolsa CNPQ, reuniu documentação inédita sobre o tema, permitindo traçar o mais completo registro sala a sala. Pranchas de arquitetura, fotos e outros documentos estão reunidos na base de dados disponível no portal do AHSP. Entre setembro e outubro de 2012 a Galeria Olido recebeu a exposição do projeto, também disponível online: Salas de cinema em São Paulo: 1895-1929.


    ISSN: 1981-0954



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    *Roteiro para leitura
    Avenida Abílio Pereira de Almeida

    Avenida Abílio Pereira de Almeida  

    Avenida Abílio Pereira de Almeida, distrito de Rio Pequeno.

    Logradouro de bairro em homenagem a diretor de cinema da década de 1950
    contrasta com a via expressa que referencia o grande empresário
    de telecomunicações Assis Chateaubriand de presença ocasional no cinema.

    Consulte no link Fontes, verbetes resumidos sobre cada logradouro.

    Fonte: Google Street View (cf. Google Street View Image API)


    Avenida Assis Chateaubriand

    Avenida Assis Chateaubriand, distrito de Santana, pista da Marginal Tietê

    Fonte: Google Street View (cf. Google Street View Image API)


    Outra geografia pode ser identificada na cidade se focarmos o setor da produção cinematográfica. Embora seja possível identificarmos algumas áreas de concentração de produtoras no período recente como por exemplo a região da Vila Madalena ao longo da década de 1980 e Vila Leopoldina na última década, talvez o setor da cidade que teve maior expressão e visibilidade sob esse aspecto seja aquele conhecido entre as décadas de 1960 e 1980 como a "Boca do Lixo".

    Ocupando ruas do bairro de Santa Ifigênia, a área reunia produtores e distribuidores de cinema. A concentração, em parte justificada pela proximidade com as estações ferroviárias da Sorocabana e da Luz, junto à antiga rodoviária, que facilitavam a remessa de filmes para o interior do estado, ocupava trechos das Ruas Vitória, Aurora e Triunfo.

    As denominações das ruas, vias em parte já ocupadas também pelo meretrício, remetem à Guerra do Paraguai (1864-1870). A região até o início da década de 1960 era fronteiriça à parte elegante da Avenida São João de um lado e de outro vizinha ao antigo Palácio dos Campos Elísios, ocupado pelo governo estadual.

    Duas pesquisas sobre a região são de menção obrigatória. Em 1981, mais uma vez, Inimá Ferreira Simões lança pelo antigo IDART, unidade da Secretaria Municipal de Cultura, o livro O imaginário da boca. Entrevistas com produtores e realizadores, realizadas em bares e escritórios da região permitem traçar um quadro diversificado sobre o período entre 1978 e 1980. A publicação é rica também pelos registros fotográficos do bairro e suas principais personalidades cinematográficas.

    Contudo, o mais expressivo registro da Boca foi realizado por um dos seus diretores de destaque: Ozualdo Candeias (1922-2007). Realizador importante, na verdade diretor inaugural do “Cinema Marginal”, Candeias lança em 2001 o livro Uma rua chamada Triumpho. Edição limitada, com apenas 200 exemplares, teve no ano seguinte nova tiragem pelo interesse despertado. Aqui, Candeias, fotógrafo e íntimo participante da comunidade apresenta uma leitura "antropológica" radical. Bares, eventos e retratos de personalidades delineiam a Boca do Lixo. Os retratos são talvez uma das marcas distintivas da produção do autor; neles Candeias produz fotomontagens que expressam graficamente a carreira dos principais realizadores do Cinema da Boca.

    Essas imagens foram expostas em 1984 na exposição A boca, realizada na sede da Imprensa Oficial. Cinco anos depois, o Museu da Imagem e do SOM (MIS) recebe a mostra Uma rua chamado Triumpho, apresentando o resultado de 20 anos de documentação da Boca. Em 2002, a Retrospetiva Ozualdo Candeias – 80 anos apresenta em seu catálogo um dos primeiros artigos sobre esse segmento da produção do autor: Candeias, fotógrafo, escrito pelo pesquisador Ricardo Mendes. O organizador deste evento, Eugênio Pupo, será o responsável pela exposição Rua do Triumpho, realizada no MIS, em 2012 durante o evento Maio fotografia, talvez a mais ampla retrospectiva sobre essa faceta do cineasta falecido em 2007.


    O cinema das ruas

    Data da primeira metade do século XIX a percepção de que se impunha pouco a pouco a necessidade de providências para estabelecer algum controle sobre a numeração dos prédios e a denominação das ruas na cidade de São Paulo.

    Nomes de caminhos e ruas de toda espécie foram definindo-se ao longo dos séculos XVII e XVIII de modo informal em quase sua totalidade. Com o crescimento acelerado da cidade na segunda metade do século XIX, e em especial, na última década, a situação se tornaria, contudo, um elemento de pertubação da rotina urbana.

    O aumento da população em escala nunca vista na cidade e a consequente expansão física, seja em número de edifícios, seja a área urbana em crescimento, indicavam um momento de aceleração igualmente das relações de troca e comunicação de toda espécie. Com o século XX o problema era evidente, frente ao número de logradouros com nomes não oficiais ou sem denominação simplesmente.

    Ainda que problema “menor” frente às demais necessidades de intervenção e a estruturação de um sistema de gerenciamento urbano, as dificuldades decorrentes eram claras no dia a dia.

    Para compreender melhor esse processo histórico, recomenda-se a consulta ao Dicionário de Ruas, página do site institucional que traz amplo panorama sobre esse aspecto. Nesta edição temática, basta indicar alguns momentos significativos desse processo para a presente abordagem.

    No momento inicial do século passado, o governo municipal realiza empreitadas na tentativa de solucionar a questão, ao menos temporariamente. Episódios de denominação em massa de logradouros ocorrem assim em anos como 1914 e 1916.

    Em 1936, o ato 1013 estabelece “normas para denominação das vias públicas, numeração dos imóveis, emplacamento e registro de ruas particulares”. Um aspecto notável é que essa legislação, através do artigo sexto, integra a esse processo a equipe do recém-criado Departamento de Cultura para avaliação do mérito das proposições.

    Quase oitenta anos depois, o Arquivo Histórico de São Paulo continua a auxiliar outros órgãos do Executivo nessa ação como também o Legislativo. Responde também por difundir junto à população dados sobre a questão, para o que faz uso em especial do serviço Dicionário de ruas, disponibilizado na internet a partir de dezembro de 2003.

    Os problemas relativos à ausência de denominação, ruas não oficiais ou homonímias, no entanto, acompanharam a passo apertado o crescimento paulistano. Na segunda metade do século XX, novamente o poder público promoveu denominações em massa (1953, 1955, 1962, 1968, 1972, 1973 e 1974).

    Além das necessidades em questão, a legislação brasileira imporá claramente essa obrigação aos municípios. Em 1969, através de decreto-lei estadual, conhecido como Lei Orgânica dos Municípios, reforçasse essa tarefa que se estende agora até mesmo aos próprios municipais, em outras palavras construções que abrigam serviços da cidade.

    Em 1975, como informa o Dicionário de Ruas, a imprensa registrava que vinte mil logradouros não tinham denominação oficial num total 45 mil vias. Nesse contexto imediato é implantado em 1977 o Banco de Nomes, gerenciado pela Secretaria da Habitação (SEHAB). O projeto contava com três consultores: o arquiteto Benedito Lima de Toledo, o professor Flávio Di Giorgi e o jornalista Lauro Machado Coelho.

    A base de dados atinge assim um universo de 25 mil sugestões com indicações relativas aos mais diversos campos do conhecimento. Ao final da década de 1980, o então Arquivo Histórico Municipal passa a colaborar na apresentação de sugestões para o banco.







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    Para citação adote:

    MENDES, Ricardo, MIRANDA, Luiz Felipe. As ruas de São Paulo:
    Memória do cinema nos logradouros da cidade.
    INFORMATIVO ARQUIVO HISTÓRICO DE SÃO PAULO, 8 (31): dez.2012
    <http://www.arquivohistorico.sp.gov.br>


     
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